segunda-feira, 23 de novembro de 2015

@Precisamos falar de como Hunger Games é horrível

Escrevi o texto a seguir no Facebook depois de assistir o quarto filme de Hunger Games. Achei que valia guardar para a posteridade aqui.
* * *
Eu nem deveria escrever isso aqui porque tá na cara que Hunger Games é horrível mesmo, mas eu tinha que tirar isso do peito, já que eu assisti o quarto filme ontem.

Se você tem 12 anos e tem medo de spoilers, não leia a seguir.

1) Como você pode ler nestes textos aqui (1, 2, 3), a Katniss, desde o primeiro filme, não tem nenhuma agência. Ela só é um peão no tabuleiro da série sendo manipulada pelos outros. Ela não faz nenhuma escolha, ela não avança a história de nenhuma forma. Isso não seria tanto problema se ela não fosse heroína feminista, mas a gente espera que mulheres símbolo de Força demonstrem pelo menos alguma faísca de independência (vou falar mais disso a seguir).

2) O segundo Hunger Games que inventaram pra encher linguiça (o tal do Quarter Quell) foi pura preguiça de roteiro. Não tinha qualquer necessidade de acontecer, mas eles colocaram aquilo ali no meio de qualquer jeito. Aí, as it turns out, não só a Katniss e o Peeta eram os únicos que não sabiam do MASTER PLAN pra libertar todo mundo dentro do jogo, mas o gamemaker Plutarch é do BEM (mais sobre isso a seguir), apesar de ele já ter tentado matar todo mundo inúmeras vezes com armadilhas ridiculamente difíceis de escapar.

3) No começo do último filme, o Peeta recebeu lavagem cerebral do governo e tenta matar a Katniss sempre que a vê ou ouve falar dela. Fair enough, é até um desenvolvimento do plot mildly interesting. Mas aí, forçam a barra pra caralho quando vão mostrando o desenvolvimento dele durante o filme. No final, apesar de o Peeta tê-la quase matado tipo meia hora antes no filme jogando ela num monte de óleo, a Katniss é praticamente uma santa, o perdoa e está disposta a ter bebês com o rapaz.

4) Enquanto isso, o cara com quem ela namora desde criança diz que está disposto a aguentar um certo número de casualties se isso significa que o lado dele vai ganhar a guerra. A Katniss fica revoltada, porque aparentemente a ideia de que a guerra terá vítimas está BEYOND THE PALE. Dali, ela renega todo o romance com o cara desde criança e está disposta a ficar com o maluco que tentou matá-la durante todo o filme. Por incrível que pareça, esse é o maior exemplo de exercício de agência que a Katniss tem durante todo o filme. No resto, ela só fica sendo jogada de um lado pro outro pelos Powers That Be.

5) A certo ponto, a Katniss decide que quer matar o Presidente Snow com as próprias mãos. Maravilha, a vingança é sempre um grande motivador. Ferida, ela se esconde no avião e aparece no campo de batalha disposta a encontrar o Snow sozinha... aí desiste quando acaba colocada num time de Garotos Propaganda que não estava nem lutando nas frontlines.

Sim, a Katniss não luta, ela fica num time que está dias atrás dos verdadeiros soldados pra filmar propagandas inspiradoras.

Todo esse mote de que o Mockingjay era uma figura inspiradora necessária para a revolução era bem ridículo desde o filme anterior, mas mesmo que a gente conceda o ponto, é absurdo que você deixe os MELHORES FIGHTERS do exército pra trás pra filmarem propaganda.

E é nesse ponto que a maior parte do filme fica. O grupo da Katniss, com todos os caras que a gente conheceu nos filmes anteriores, não significa nada pro plot. Eles não são necessários em nenhum momento. Todas as aventuras deles se passam porque eles estão tentando filmar propagandas.

Eu não consigo pensar em nada mais LOW STAKES que isso. Ah, tem um monte de gente que morre nessas aventuras irrelevantes. A morte deles foi literalmente em vão.

6) Aí o Boggs, o comandante do grupo eventualmente morre e o comando passa pra Katniss meio que acidentalmente. Ela decide abrir seu plano pro resto do grupo que eles devem matar o Snow em vez de filmar propaganda. Muito bom, todo o time passa a trabalhar em equipe pra chegarem até o palácio, tem várias lutas, a Katniss está quase chegando lá, até que... ela não chega e acorda no hospital.

O filme tem cerca de 2 horas de buildup pra um confronto final que NUNCA ACONTECE. O filme não tem climax, toda a aventura da Katniss e do resto do grupo (inclusive das pessoas que morreram) não significa absolutamente nada.

7) Quando a Katniss ia chegar ao palácio presidencial, um avião joga "suprimentos" para a população nas ruas. Na realidade, os balões tinham bombas, que acabam matando muita gente (principalmente crianças) de todos os lados da guerra. Os guardas presidenciais interpretam aquilo como ordem do governo e se voltam contra o presidente. A "Revolução", que a gente nunca vê acontecer porque estamos seguindo as aventuras irrelevantes da Katniss, entra no palácio sem resistência.

8) Mais tarde a Katniss confronta o Snow, que estava preso numa estufa de plantas (????). Ele fala que na verdade, jogar bombas nas criancinhas foi um plano da Presidente Coin, a líder revolucionária, que na verdade só queria se tornar uma ditadora.

Essa é a parte mais flimsy do roteiro. A gente nunca teve qualquer sombra da ideia de que a Coin era maligna. Essa é a segunda vez que a gente ouve essa sugestão, e do cara que foi o ditador maléfico por 4 filmes. Antes disso, só o Boggs tinha dito isso logo antes de morrer (mas ele tinha dito que a Coin ia querer ser presidente, não que ia matar criancinhas e se tornar ditadora).

A Katniss fica imediatamente convencida e se volta mentalmente contra a Presidente Coin. Esse foi um dos piores plot twists que eu já vi. Ele não tinha nenhuma base pra acontecer, mas todo mundo começou a agir como se a Coin fosse malvadona mesmo.

9) Coin nomeia a si mesma como Presidente Interina e NINGUÉM FALA NADA A RESPEITO, só fazem caras feias. Depois ela decide que vai rolar um Hunger Games com a elite da capital. Numa votação da cúpula da revolução, eles decidem que o Hunger Games vai rolar mesmo. A Katniss vota "sim" com a condição de que ela execute o Snow naquela tarde.

Esse momento do novo Hunger Games era só pra mostrar "VEJAM, A COIN ERA NA VERDADE MALVADA O TEMPO INTEIRO", mas eles não estabelecem essa necessidade em nenhum momento. É só um subterfúgio muito frágil pra avançar o plot.

10) Na hora da execução do Snow, a Katniss decide que vai matar a Coin. Ela dá uma flechada na New Evil President Coin e a multidão avança pra matar o Snow com as próprias mãos. Nem nesse momento a Katniss tem qualquer agência, porque ela só tá seguindo o que o Snow disse pra ela. O Snow, por sinal, dá gostosas gargalhadas com o que ocorre.

11) Por algum motivo a multidão não ataca a Katniss depois de ter suas expectativas de execução em praça pública frustradas.

12) A Katniss NÃO É PRESA. Todo mundo passa a agir como se já soubessem que a Coin era Sinhazinha Malvadeza e pensam "Ah, essa Katniss, né? Ainda bem que ela cuidou dessa tal de Coin."

Ninguém nem pede explicações. Todo mundo automagicamente presume que a Katniss fez o Melhor Para o Povo.

Isso tudo apesar de ninguém ter levantado qualquer suspeita contra a Coin até aquele momento.

13) O Plutarch, o gamemaker que tentava matar todo mundo desde o filme 1 mas foi revelado como personagem do bem, age como se aquilo tudo estivesse dentro dos seus planos desde o começo, dando um sorriso de canto de boca. WTF? Como ele poderia prever aquilo? Por que ninguém advertiu a Katniss que a Coin era do mal desde o começo? Por que tá todo mundo agindo com naturalidade quando a Katniss tomou essa atitude supostamente chocante e out of the left field?

14) A Katniss volta para seu distrito, se casa com o Peeta e tem bebês com ele. Peeta, a esta altura, estava completamente recuperado e eles dois levam uma vida idílica próxima à natureza. Porque é fácil esquecer que o cara tentou te assassinar múltiplas vezes, difícil mesmo é perdoar a visão um pouco mais agressiva que seu namorado de infância tem sobre vítimas colaterais da guerra.

Resumo:
- A Katniss não é necessária para o plot. Ela não tem nenhuma independência, nenhuma agência. O filme sem a Katniss seria exatamente igual.
- O plot em si tem desenvolvimentos completamente bizarros e sem fundamento.
- No único exemplo em que a Katniss demonstra o mínimo de agência, ela faz uma escolha totalmente sem sentido.

9/10 would watch again

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Eduardo Cunha e o petismo facebookiano

A fama do Eduardo Cunha só mostra como esse país é um pasto. O povão que dá opinião sobre política é tão domesticado que no minuto que é eleito um cara para a presidência da Câmara que não esteja na coleira do Planalto, vira alvoroço. É como se a ordem natural das coisas tivesse sido abolida, a gravidade foi destruída, cima é baixo, esquerda é direita, versões do mundo Bizarro das pessoas começam a invadir o universo. Foi exatamente a mesma coisa quando o Severino Cavalcanti foi eleito no primeiro mandato do Lula. Ninguém acreditava e o petismo ficou revoltado. Na época, porém, o Petismo Organizado não tinha o Facebook pra ficar chorando o dia todo. Sua Malvadeza Eduardo Cunha é tão ruim, tão ruim que os poderes dele se limitam a priorizar quais projetos vão pra votação. Uma tragédia. O petismo não suportará essa manifestação de poder discricionário.

domingo, 26 de julho de 2015

Palestra sobre o problema das privatizações no Brasil

Acabei de notar que nunca publiquei minha palestra do ano passado aqui. Então lá vai.

domingo, 28 de junho de 2015

Sobre a Lei Pelé e a base dos clubes de futebol brasileiros

Comentei recentemente no Facebook sobre a Lei Pelé, que é frequentemente acusada de ter destruído os clubes brasileiros. O que pode ser verdade, mas ninguém diz que nossas fazendas foram destruídas depois do fim da escravidão. A Lei Pelé foi um avanço.

O sistema anterior, em que os clubes detinham o passe dos jogadores, era um absurdo e criava um sistema de servidão. O jogador era preso ao time mesmo que ele não estivesse contratado e sem ganhar salário. Era ridículo. Ninguém lembra, mas antes da Lei Pelé, os jogadores ficavam vários anos no mesmo time com salários pressionados pra baixo, porque não podiam comprar o próprio passe (que era colocado em níveis absurdos).

O problema de investimento na base é diferente. Tem a ver com o fato de que é impossível fazer qualquer tipo de contrato ou acordo com menores de 18 anos. Isso sim é o cúmulo. Deveria haver algum instrumento legal pra contratar os menores em quem o clube investiu. A porcentagem de clube formador é uma piada. Mas isso não é um problema da Lei Pelé, que combateu o sistema anterior que era muito pior.

Pra mim, o real problema é que o futebol brasileiro todo é estruturado em bases de 1920.

Os clubes de projeção nacional do Brasil ainda são geridos como associações de bairro, com dirigentes amadores por estatuto (literalmente amadores, eles não podem receber pelo trabalho). Essa é uma bizarrice da época em que o futebol estava se profissionalizando no Brasil e a aristocracia via aterrorizada o avanço dos jogadores pagos (e negros) e a decadência do "espírito olímpico" (que basicamente significava que receber pra jogar bola é pecado).

Isso se vê até nos programas de sócio dos clubes, que ainda contém bizarrices como "acesso às dependências do clube" -- porque você tem que ser capaz de fazer seu churrasco de aniversário na sede do seu time, claro.

Como a gestão é amadora e não tem qualquer financial stake sobre o futuro do time, acontecem esses descontroles financeiros cíclicos em todos os times. Isso acontece com todos os times, até os que são periodicamente chamados de "modelos de gestão".

O São Paulo ganhou tudo, foi chamado de modelo de gestão. Se endividou até o pescoço, desmontou o time e agora se reestrutura. O Corinthians, idem. O Cruzeiro, idem. O Vasco (meu time) torrou a grana toda num "projeto olímpico" e há 15 anos não é relevante depois de ter ganhado tudo.

Então aparece o governo pra fazer o "socorro" rotineiro aos times. No começo dos anos 2000 criaram a tal Timemania. Agora se fala em perdão das dívidas (que de vez em quando acontece, mas agora as dívidas já passam das centenas de milhões, então quem sabe?). Os clubes também tiveram um boom recente com o subsídio que receberam dos estádios novos da Copa e incorreram em ainda mais gastos.

Enquanto a estrutura dos times brasileiros não for reformada, vai ser isso aí mesmo. Ah, e não faz nenhum sentido atletas olímpicos serem patrocinados, mas clubes de futebol não poder fazer contratos com moleques de 15, 16 anos.

Quanto à CBF... bom, ela é um retrato do amadorismo dos nossos times. Literalmente, já que os 20 times da série A que votam em quem tá lá. Sem reformar os clubes, devem continuar a contratar Dungas.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

I'll take your jobs

O que eu acho peculiar nessas campanhas de esquerda anti-machismo, discriminação, etc, é como elas se beneficiam da fragilidade dos empregos dentro do capitalismo.

Alguém fez um comentário ruim? No problem at all, é só ele ser demitido, porque o trabalho é infinitamente substituível!

A sanha de demitir todo mundo e arrasar a vida das pessoas porque eles fizeram um comentário desagadável ("microagressão"). Talvez isso satisfaça os novos esquerdistas, mas eu acho um tanto preocupante.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Respeito?

Para a polícia não basta eles terem o poder físico e a legitimidade. Eles querem ter a deferência, a educação, a pompa e a celebração dos cidadãos comuns.

É uma classe especialmente treinada para se sentir superior e cheia de direitos que as pessoas normais não têm e para agir com violência se se sentirem afrontados. A legitimidade da polícia não pode ser questionada, nunca.

Aqui (link para o Facebook), um jovem que foi detido (segundo a página em que o vídeo apareceu, por uso de maconha). Algemado, os policiais ainda provocam o rapaz.

Ele foi corajoso. Como dizia Robert Anton Wilson, não existe comunicação entre desiguais, apenas relações de poder. Do mesmo jeito, não existe respeito entre desiguais. Somente força.