segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

Papéis trocados

Tá, ok, título clichê, mas o que se pode dizer da expressão "Deus é fiel"?

É como se, de repente, fôssemos nós a ameaçar Deus com pragas no paraíso e a morte do seu primogênito. Por algum motivo, entortaram a história. A fidelidade não deve ser de Deus, porque todos têm vários inimigos acreditando nele ao mesmo tempo e seria impossível seguir fiel a ambos. E, se se trai uma pessoa, deixa-se de ser fiel. É impossível para Deus ser fiel. É como se eu, protestante da Universal, desejasse a morte de um inimigo meu, da mesma igreja, e Deus o matasse e não matasse. Não dá. Talvez ele o deixasse aleijado, um meio termo bastante ponderado, mas eu quero que ele morra, só isso me satisfaz.

Mas não, não, as pessoas insistem em exigir fidelidade de Deus, como se Ele fosse nosso subordinado, nosso empregado. É como um faxineiro pedir ao dono da empresa pra lhe ser fiel. O dono não ganha nada com isso. Há vários faxineiros por aí, poucos empresários. Se o mercado de deuses fosse mais movimentado, poderíamos exigir fidelidade deles, sob pena de trocá-los por outros. Faziam isso na Grécia, e eu acho que era uma atitude bastante inteligente dos gregos essa de cultuar vários deuses. Como tudo é uma questão de fé, sou obrigado a conceder aos gregos o título de fé mais racional.

"Qual é, Poseidon, não vai me deixar navegar? Vou fazer oferendas a Athena, a partir de hoje", diria um grego em ameaça. Certamente Poseidon cederia. Quando só se pode contar com um Deus a história é outra. Um Deus único não tem nada a perder. Se você deixá-lo, ficará sem proteção divina. Não há o direito à troca.

P.s.: O título é clichê, de fato, mas imaginem se eu preferisse chamar o texto de "trocando as bolas com Papai".